Nem todos os contrabaixistas têm a sorte de conseguir um contrabaixo bom para tocar e/ou estudar.
A qualidade dos instrumentos é tão diversificada, que alguns contrabaixos até se dão ao luxo (?) de ser chamados mimosamente de “caixotinhos de bacalhau”…
O amor é lindo, não é mesmo?
Mas, mesmo sendo o talvez-não-tão-feliz proprietário de uma preciosidade dessas, pense que pelo menos você tem um contrabaixo, enquanto muitos aspirantes a contrabaixistas -e até mesmo alguns contrabaixistas-, sequer têm um, valendo-se de sonhos ou de instrumentos emprestados enquanto a cegonha contrabaixística não os visita.
Parafraseando um antigo ministro que dizia que o “cachorro também era um ser humano como outro qualquer” (ou algo do tipo), podemos dizer que até os caixotes de bacalhau também são instrumentos e, por isso, merecem cuidados, mesmo quando destituídos de atrativos.
Por mais esdrúxulo que possa parecer, contrabaixos também são instrumentos frágeis e delicados.
Assim como no famoso filme de faroeste Shane, de George Stevens, Os Brutos também Amam, na nossa vida contrabaixística os “brutos” também são – e devem ser- amados… Bem amados, please!
Mas para que esse amor não termine em tragédia operística, gostaria de passar para você alguns cuidaditos básicos bem democráticos, que servem para tanto para contrabaixos, quanto para contrabaixistas, feios ou bonitos, bons ou péssimos.
Quando se fala em cuidados, um dos primeiros quesitos são os tombos.
Tombos são uma questão de física, de muita sorte e de alguns cuidados.
De um modo geral, o tampo do instrumento (parte da frente) é uma parte delicadíssima, e tombos em que o contrabaixo se estabaca com o cavalete voltado para o chão, ou quando algo atravessa o tampo do instrumento, costumam causar grandes avarias a ele, muitas delas irreversíveis.
Às vezes, o estrago é tão grande que a solução é trocar o tampo do instrumento, e nem sempre compensa fazer isso, financeiramente falando.
Em outros casos, trocar por um tampo do mesmo nível do original sai tão caro, que não tem como fazer o serviço com esse nível de exigência…
Instrumentos de madeira são mais resistentes ao tempo que os de compensado.
Aqui vão uns cuidadinhos básicos, quase um segredinho de beleza para o seu contrabaixo:
Evite deixar o contrabaixo no chão; apoie o bonitinho no canto da parede (quina), com o cavalete voltado para a parede; com os “ombrinhos” apoiados nas paredes; com os “quadris” um pouco afastados das paredes; e com o braço alinhado exatamente na linha entre as duas paredes. Ele ficará ligeiramente inclinado para frente, ou seja, com os “ombrinhos” mais próximos da parede e com os “quadris” um tico mais distantes dela.
Cuidados durante as apresentações: evite deixar o seu lindo no chão.
Se não houver jeito, proteja as laterais dele com uns caquinhos de madeira ou pedacinhos de borracha, para que a madeira não fique em contato direto com o chão, porque o verniz vai embora com isso. Contrabaixo não é enceradeira.
Outra coisita: fivelas de cintos costumam arranhar todo o verniz do instrumento. Vire a fivela para o lado, ou ponha um pano sobre ela ou vá sem cinto. Pense que, se a calça cair, o contrabaixo te protegerá, ou te dará a chance de encarar – de frente – uma grande performance!…
Se você foi apoiar o fofinho na cadeira, veja se ela é segura, e se ele está com o “C” – aquela curvinha que fica entre o “ombrinho” e o “quadril”- bem assentada na cadeira.
Avente a possibilidade que ele pode escorregar e cair.
Pense que não é só você que escorrega na poltrona comendo batata frita na frente da televisão, e que contrabaixos não precisam nem de batata frita para isso: só do seu descuido.
Se você for mesmo colocá-lo no chão, eleja um local menos movimentado para isso, ou seja, com o cavalete voltado para uma parede, com o espigão protegido de pernas cegas, e com uma boa quantidade do fio da captação por perto, pois caso algum imbecil resolva tropeçar no fio, ainda há uma margem de fio antes dele levar o seu contrabaixo junto.
E NUNCA deixe o contrabaixo apoiado num banco de contrabaixo, daqueles altos.
Alguns palcos mais assanhados sacodem até com os passos das pessoas, e alguns pisos são tronchos.
Para você não ficar na neura de pedir para passarem com cuidado perto do seu contrabaixo que a-do-ra ficar sentado no seu lugar enquanto você não está, ou de ficar verificando o caimento do palco, adote a mania de deixá-lo em locais mais seguros.
Sabe aquele ditado que diz que “para morrer, basta estar vivo”?
Pois é, para o contrabaixo morrer basta estar em qualquer lugar, porque em pé ele pode cair, sentado ele pode cair e deitado ele também pode cair, se aquele estúpido tropeçar nele…
Essa é uma dica especial para as moçoilas contrabaixistas: cuidado com o trio sertanejo Contrabaixo, Saia Comprida & Escada. E processem o empresário que quiser fazer um quarteto com o Salto Alto…
Agora, se não der para terceirizar o serviço de subir escadas com o contrabaixo, bem acompanhado da Dona Saia Comprida e do Seu Salto Alto, dê um charmoso nó na sua saia, na altura dos joelhos.
É melhor arranjar um nó na saia do que arranhões no joelhinho tímido e escoriações no contrabaixo dublê de avião…
Afora tombos e arranhões, aqui vai mais uma dica: capas de material sintético são ótimas para fazer churrasquinho de contrabaixo. Basta um cigarrinho por perto, ok?
Contrabaixos também sofrem de hidrofobia: a madeira molhada e/ ou a umidade podem descolar o instrumento, empená-lo e… desvalorizá-lo, ou fazer você gastar dinheiro para tratar do “resfriado” adquirido no quase inocente banhinho.
Para quase terminar, a resistência física do instrumento depende mais do material que ele foi feito, da construção dele e do cuidado que se tem com ele, do que do tamanho.
Nem todos os contrabaixistas têm a sorte de conseguir um contrabaixo bom para tocar e/ou estudar, mas o inverso também é verdadeiro: nem todo contrabaixo tem a sorte de conseguir um contrabaixista cuidadoso que o toque e/ou estude…
E para terminar de vez, desculpem-me a sinceridade, mas acho que esses trogloditas que pisam no contrabaixo – e de sapatos!- com a pretensão de fazer disso música, deveriam sempre levar um bom tombo na hora das apresentações, daqueles de quebrar braço e perna, até pararem de torturar um pobre e inocente contrabaixo, que só veio ao mundo para fazer… música!
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